Poethical Reading
Denise Ferreira da Silva & Valentina Desideri
Imagem de jogo de Tarot tirada no dia 5 de julho de 2020, tendo como pergunta de fundo “O que o momento está oferecendo para a vida?”
"Poderia a intenção da poeta emancipar a Categoria da Negridade dos modos de conhecer científicos e históricos que a criaram, a qual é também a oficina da Crítica Negra Feminista? Uma vez emancipada da ciência e da história, a Negridade vaguearia pelo Mundo considerando outra práxis, com o mandato ético de abrir outros modos de conhecer e fazer? (...) Sim. Desde fora do Mundo que conhecemos, no qual a Categoria da Negridade existe no/como pensamento sempre-já um referente da mercadoria, objeto, outro, como um fato mais para além da evidencia –, uma Poética [Poethics] da Negridade, ou seja, está figurada pelo sexual no corpo feminino, seria capaz de anunciar".
- Denise Ferreira da Silva - “Para uma poética negra feminista: A questão da Negridade para o (fim do) mundo”, in A Dívida Impagável, ed. OiP e Living Commons (São Paulo : 2019).
"Uma poética somente pode levar tão longe sendo uma po-ética. Se quiser abraçar a vida complexa na terra, se já não puder fingir que todas as coisas são fundamentalmente simples ou elegantes, uma poética engrossada por um ética que lança uma exploração do significado da arte como, e não apenas sobre, uma forma de viver no mundo real. Esse ‘como’ não é uma analogia; é um ethos. Daí a junção/quebra. O que estou trabalhando é, tão explicitamente, uma poética de um realismo complexo".
- Versão livre para o português de Joan Retallack, “Poethical Wager”, 2004
E se, em vez de fornecer uma resolução, uma resposta direta, ou uma interpretação definitiva, uma leitura nos ajudasse a navegar a complexidade da existência - atendendo aos seus momentos reais e virtuais -, às suas diferentes posições, relações e camadas que também nos constituem? Cada leitura expõe possibilidades, revela bloqueios e desloca perspectivas. Para além dos princípios da não-contradição e da identidade, as leituras concebem um espaço onde coexistem múltiplas articulações de situações e eventos sem a imposição de um único significado ou direção.
Inspirando-se nas práticas uma da outra, Denise e Valentina juntam-se para fazer leituras experimentais. Elas experimentam com “ferramentas de leitura”, inspiradas em práticas já conhecidas e recém-concebidas - como os Tarôs, a Terapia Política, a Quiromancia, a Fake Therapy, assim como o Reiki, a Astrologia, e a Filosofia.
Pertencendo ao tipo de conhecimento a que Walter Benjamin chama faculdade intuitiva e Carl G. Jung nomeia como ‘pensamento criativo’, estas ferramentas de leitura montam imagens. Ler como “imagear”, nessa prática, consiste numa montagem que expõe e navega o complexo contexto que constitue a situação, evento ou problema que atravessa uma pessoa ou coletivo, num dado momento e lugar. Como tal, visa expandir o horizonte de interpretação, ou seja, abrir possibilidades e perturbar realidades.
Para EhChO, Denise e Valentina fizeram uma apresentação ao vivo de Leitura Poética em que utilizarão a ferramenta do Tarot para imagear este momento político complexo em diálogo com os participantes, partindo das imagens fornecidas pela leitura.
A filósofa e artista visual Denise Ferreira da Silva, nasceu no Morro do Pasmado (Botafogo), cresceu na Vila Aliança (Bangu), Rio de Janeiro. Tendo morado e ensinado em universidades nos Estados Unidos, Austrália, Inglaterra, atualmente ela vive e trabalha nos territórios da nação indígena Musqueam e é Professora Titular e Diretora do Social Justice Institute da Universidade de British Columbia, em Vancouver, Canadá.
Foto: Alex Woodward @ Arika’s Episode 7
Valentina Desideri faz Fake Therapy e Terapia Política, é uma das co-organizadoras do Performing Arts Forum na França, especula com Stefano Harney, experimenta Leituras Poéticas e Sensing Salons com Denise Ferreira da Silva, faz parte da Oficina de Imaginação Política, ela lê e escreve.